5.2.10

criança sonho


E eu ouvi um choro no meio da noite. Era a criança sonho que acabava de ter um pesadelo. Ela me chamava porque tinha medo do escuro. Coloquei o meu no bolso, e fui. Porque juntas somos fortes. E nos contamos histórias de navios piratas e fantasmas nos calabouços, para que o tempo passasse mais depressa. De mãos dadas as coisas não são tão feias assim. Depois ela me pediu para que eu voltasse a dormir, o dia já estava aí. Mas eu disse que não. Ficaria ali até que os fantasmas voltassem pros túmulos. Até que nascesse nela, o primeiro sinal de asa. O que não demorou muito a acontecer, porque ela é a pipa, a que voa.

Era uma pipa criança, que teimava em fazer manha quando as coisas não iam bem. Fazia birra, esperneava, tingia o céu de preto e dizia palavras sem feitios. Não, não me venha com xurumelas. Eu sei que a sua dor hoje é demais. Mas ocê não pode parar de remar. Lembre-se que estamos numa corda bamba. Um dia a gente pensa que vai cair, no outro a gente recupera o equilíbrio. E a vida continua. Porque já dizia um certo Guimarães: 'O que ela quer da gente é coragem'. E digo mais. Ela quer da gente é sorriso em dia de chuva. Um arco-íris no olho e céu estrelado. Durma, Pipa, durma. Amanhã será um novo dia. Levantará mais disposta e recuperará os sonhos perdidos. Por enquanto reze pro teu anjo da guarda, não esqueça da oração que te ensinei. Peça força e sabedoria para entender o que o coração ainda não dá conta. E carregue as coisas boas, todas elas, na algibeira da alma. Porque o que a gente leva dessa vida, Dona Pipa, são os risos, os abraços, os carinhos na alma. E isso ninguém nos rouba. Carregue-os com você. Assim, permanecerão vivos para todo o sempre. E te fortalecerá na estrada da vida, que é cheia de espinhos, mas de flores lindas também. Esta noite, toco no teu coração e te arranco uma farpa com as mãos. Agora, deixa sarar. É só questão de tempo. Um dia, você volta a voar como antes. Eu te juro.
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Te mando minhas vibrações coloridas para juntar com as tuas.
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PS: Ei, Psiu, estou sempre aqui, viu, do lado de dentro!
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PS2: Se amanhã o sol sair, te prometo o céu!
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PS3: Eu me vou. Mas não te deixo nunca!
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2 comentários:

lídia martins disse...

"O que sinto.
Não sei dizer."

ele, o Renato.



Mas seguro esse terço bento cintilante que me deu. Pra benzer os últimos sopros de vida de alguém que tanto amei. E há de acender um mundo invisível a ela. Mas cheio de estrelas pra iluminar essas palavras surradas que tem andado comigo a cada passo que dou. Eu te juro que não queria falar dessa minha morte. Só queria desaparecer sem deixar qualquer vestígio.



Te abraço. Me abraças.

Quem escreve disse...

Uma coisa carrego comigo: todas as sensações que já vivi. E algumas me dão medo mesmo hoje, mesmo tanto tempo passado... tenho a segurança de seguir em frente, sempre, como se fosse para sempre, háháhá. Desculpe o riso irônico, mas é natual, é puro, aliás, falar de morte para mim é criança falar de brinquedo, faz parte do dia a dia. Estar velho no espelho não significa o estar de verdade, por dentro. E vice versa. Mesmo assim me assusto no espelho, especialmente aquele que meus pais carregaram no rosto. Minhas marcas eram predilições das deles. Minha voz às vezes escoto meu pai nela e vejo minha mãe nos cantos dos meus olhos.

Desculpe se não falo só flores, mas é pq eu também amo aquilo que não me fez cócegas um dia: foram justo eles que me deram coragem do Guimarães.

As flores me deram o sorriso e a lembrança de vc, chão.